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ENTREVISTA »Em busca de novos caminhos

Publicado em 28.05.2010 pelo Jornal C.

A falta de qualificação profissional impede o acesso ao mercado formal de trabalho. Estudar é o desafio dos mais jovens

Os povos ciganos eram conhecidos pela música, pela leitura de mãos e por serem negociantes de animais de carga (cavalos e jegues) e fabricantes de utensílios de metal. Porém, a modernização das cidades e a abertura de rodovias mudaram os rumos das exóticas e temidas famílias de caminhantes no Nordeste. A primeira e mais drástica mudança é a vida sedentária, que os obrigou a buscar outras profissões.

Tarefa difícil quando se é analfabeto e malvisto pelo restante da população. A falta de documentos é outro obstáculo que, inclusive, atrapalha o acesso a serviços básicos como saúde e educação. Pedir esmolas, ler mão, rezar, negociar rádio, televisão e bicicletas velhos são as respostas mais comuns em Sousa, quando indagados sobre as atividades do chefe da casa.

“Somos muito discriminados. Logo que nos estabelecemos na cidade, tudo de ruim que acontecia em Sousa era jogado para cima dos ciganos. É complicado achar emprego”, diz João Viana de Alencar (Eládio), um dos líderes da comunidade.

Os poucos que conseguem trabalho, são mal remunerados, como Edneide Lemos de Castro, 40 anos, doméstica sem carteira assinada que recebe R$ 80 por mês. Na visita a Sousa, Edneide foi flagrada oferecendo coco verde como almoço aos filhos. Sentada no chão da casa, disse que tinha ganhado a fruta.

Aos 72 anos, Maria Abrantes Pereira vive de pedir esmolas na mesma cidade. “Estou velha, não tenho forças para acompanhar um comboio”, justifica. O pouco que ganha, Maria divide com a filha e os quatro netos. “Ela é muito pobre”, lamenta, em sua casa de taipa mobiliada apenas com dois bancos, uma rede, uma arca, um guarda-roupa quebrado e um tripé com poucas panelas de alumínio.

Há, ainda, cantores profissionais. Não de música cigana, mas de sertaneja, brega e romântica. Em Santa Cruz, Sertão de Pernambuco, a dupla Fresinho e Naelson ganha a vida com o ritmo sertanejo. “Gravamos um CD em 2006 e somos contratados com frequência para festas na cidade”, diz Raimundo da Silva Ferraz, 44, Fresinho, que é irmão de Naelson.

Em Ouricuri, na mesma região, Abel Lacerda, 26, é o vocalista de uma banda sertaneja e romântica. Ele é o único integrante cigano. “Vivo da música”, revela Abel, encontrado num posto de saúde quando se vacinava contra a gripe A (H1N1).

Ronaldo Carlos, 59, seresteiro de Sousa, faz questão de mostrar os dotes artísticos. “Não seria justo vocês voltarem sem ouvir nada, depois de a gente falar tanto que cigano gosta de cantar”, comentou.

Com um violão emprestado, ele iniciou o repertório entoando Só você não vê, finge que não sabe, que eu estou sofrendo por causa de você. Passou por Roberto Carlos, Valdick Soriano, Fernando Mendes. Não demorou muito e uma roda de ciganos se formou em volta do seresteiro, no meio de uma das ruas da comunidade. “Estou parado porque preciso de um teclado”, aproveita para avisar.

Os irmãos José Iran Ferraz da Silva e Paulo Ferreira Ferraz, moradores de Paulista, no Grande Recife, formaram a dupla Iran e Iranei, de estilo romântico e sertanejo. Sonham em gravar um CD e já produziram uma versão demo (Recordações Ciganas) com 24 músicas, três faixas de autoria deles.

Fãs de Roberto Carlos, eles dominam o cavaquinho, o violão e a guitarra. E costumam animar palanques de políticos nas campanhas eleitorais.

Um dos líderes em Currais Novos, no Rio Grande do Norte, Francisco Ednaldo de Morais, 33, complementa a renda com a música. Naldinho Cigano é o nome artístico do seresteiro, que já gravou um CD de música brega. “Vendo durante os shows. Quando não tem apresentação, faço o que todos nós sabemos fazer: vender e trocar.” A filha, de 10 anos, integra o grupo de dança cigana da escola.

Seja no Grande Recife, seja no Sertão, os ciganos encontram outra forma de sustentar as famílias. Eles constroem casas para vender ou alugar. “Meu irmão vendeu uma em Juazeiro, usará metade do dinheiro para fazer outra em Petrolina e vai viver com o restante”, conta Manoel Alves, conselheiro dos ciganos de Petrolina. Outros vivem de aposentadoria e benefícios sociais do governo, como o Bolsa Família.

São raros os que ingressam na faculdade, como Jucelho Dantas da Cruz, Josileide Alves Martins e Francisco Vitoriano. Engenheiro agrônomo com mestrado em ciências agrárias e doutorado em zoologia, Jucelho é professor de biologia na Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS-BA).

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